Jorge Trevisol: “a busca pelo autoconhecimento é a maior tarefa que temos na vida”

Destaque do Congresso Internacional de Felicidade pela quinta vez consecutiva, filósofo, teólogo, escritor e compositor defende foco na espiritualidade e na interioridade em contraponto ao superego e às influências externas

O mundo vive uma época de altíssima velocidade e de superexposição, no qual as pessoas buscam cada vez mais atender às expectativas dos outros – o que tem gerado cada vez mais ansiedade, doenças físicas e psíquicas e um grande desconforto existencial. Nesse cenário, a busca constante pelo autoconhecimento não deve ser apenas uma orientação, mas “a maior tarefa que temos na vida”. Essa é a visão de um grande estudioso do tema, o psicoterapeuta, filósofo, teólogo, escritor, cantor e compositor Jorge Trevisol.

Doutor em educação e mestre em psicologia e espiritualidade, Trevisol tem feito sucesso ao abordar em suas palestras, recheadas de canções e orações, a necessidade de voltarmo-nos à interioridade. Este ano, ele estará novamente no Congresso Internacional de Felicidade, que ocorre em novembro na cidade de Curitiba, do qual já é presença certa desde a segunda edição, em 2017.

“O mundo de hoje se baseia no ego, e o ego é narcisismo. O mundo externo se baseia na imagem, e não na interioridade, não na profundidade – e a imagem é superficial. Narciso é aquele que se viu espelhado num lago, se encantou pela beleza aparente de si mesmo, quis beijar a si próprio e morreu afogado. Essa dinâmica do narcisismo é a mesma da nossa sociedade atual, defende. “Por isso, se autoconhecer não é uma tarefa de um dia ou dois, de um ano ou dois, de um curso ou dois, mas uma tarefa para a vida toda.”

Confira a entrevista à Zelig:

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– Vivemos em um mundo de excessiva exterioridade, com grande parte das pessoas mais preocupadas em mostrar do que em ser. Esse fenômeno ocorre cada vez mais cedo, entre jovens e agora entre crianças. Como lidar com esse cenário?
– O fenômeno de tendência de mostrar mais do que se é ocorre porque a sociedade se organizou em torno de padrões culturais e vive mais propriamente na personalidade do que na espiritualidade. Então, enquanto mais as pessoas vivem fora de si mesmas, tanto mais elas precisam responder às expectativas da exterioridade. E também acontece o contrário: quanto mais as pessoas vivem dentro, mais respondem à exterioridade a partir de sua interioridade. O problema surge quando estamos longe de nós mesmos e focamos apenas naquilo que está ao nosso redor. Aí parece que a realidade é aquela que vemos, e não propriamente aquela dentro da qual realmente estamos. Ao passo que, se eu permaneço na minha interioridade, e exterioridade é que fica em função dela. Em palavras mais simples: o mundo de hoje se baseia no ego, e o ego é narcisismo. O mundo externo se baseia na imagem, e a imagem é superficial. Narciso é aquele que se viu espelhado num lago, se encantou pela beleza aparente de si mesmo, quis beijar a si próprio e morreu afogado. Essa dinâmica do narcisismo é a mesma da nossa sociedade atual: quanto mais ficamos respondendo ao mundo da exterioridade, tanto mais nos afogaremos nela, porque ela é insustentável, finita e quebrantável a todo instante.

–Qual é a importância do autoconhecimento para a busca do equilíbrio, tanto no aspecto espiritual quanto físico e mental?
– O autoconhecimento é um grande veículo por meio do qual podemos acessar a interioridade e também respondermos à altura a exterioridade, sem mais nem menos. Quem se conhece, se reconhece e reconhece o que está fora. Agora, aquele que não se conhece, se confunde com aquilo que está lá fora. Muitas vezes o sucesso não é o sucesso do ser, mas sim o sucesso do ego, que organizou parâmetros como uma escada de ascensão. Mas mesmo quando a pessoa chega lá no topo ela não se sente plena. Ao passo que quando acessamos pouco a pouco o nosso ser pelo autoconhecimento, vamos percebendo que cada pedacinho que é reconhecido avoluma a nossa consciência de tal forma que nos tornamos mais serenos e felizes, porque a felicidade está na capacidade que temos de compreender a totalidade de tudo o que nos acontece. Na verdade, aquele que é feliz alcança justamente o que ele mais espera, mas não é feliz apenas porque alcançou, mas é feliz por cada passo dado no caminho. Por isso, se autoconhecer não é uma tarefa de um dia ou dois, de um ano ou dois, de um curso ou dois, mas uma tarefa para a vida toda. Talvez seja a única tarefa que a gente tem nesse mundo para que em nossa existência possamos alcançar a nossa mais profunda essência.

– Como não ser afetado internamente diante de cenários tão negativos que surgem pelo mundo, desafios e obstáculos?
– A melhor forma de manter o entusiasmo é sentir-se observando o mundo mesmo estando dentro dele. Num dos últimos momentos de Jesus, com seus discípulos fazendo uma oração, ele disse: “eu rezo para esses meus amigos que aqui vão ficar. Porque eles não são o mundo, eles só estão no mundo.” E essa é a verdade: quando eu tenho minha morada na interioridade eu vou notar que eu não sou o mundo, o mundo é apenas onde eu transito – então o mundo pode estar mal que eu não tenho necessariamente que estar mal; o mundo pode estar bem que eu não preciso necessariamente estar eufórico. O mundo externo deve ser visto segundo o tamanho e a profundidade do mundo que temos por dentro. Agora, é verdade, estamos em uma crise muito grande da humanidade – no fundo, estamos passando da humanidade para a universalidade. Saindo da consciência que é humana para termos uma consciência que é universal, e para isso há que se romper com os parâmetros de tudo o que já vivemos e cristalizamos neste mundo material. Então, ao meu ver isso é doloroso, mas necessário. Só se estressando de onde a gente está, é que a gente vai mudar de lugar. Só rompendo com aquilo que nos cristaliza, é que vamos nos tornar mais flexíveis. Para isso, é preciso entrar em crise a todo instante, e a crise se tornou mundial para que essa humanidade se torne universal.

Jorge Trevisol no Congresso de Felicidade 2022.

– Como você busca a felicidade?
– Já teve um tempo em que eu buscava ser feliz. A minha busca hoje é pela verdade que preciso viver, então o meu coração fica inquieto até saber se aquilo que estou vivendo é exatamente aquilo que eu preciso viver, para que eu não me iluda vivendo o que não preciso, ou perca tempo vivendo o que é desnecessário. Então a felicidade, principalmente nessa época da minha vida, na idade em que estou, é o resultado do quanto aquilo que estou vivendo está também concretizando o propósito para o qual eu vim. O tamanho do desconforto tem o tamanho da distância do quanto estou longe do eixo da minha existência, então eu fico atento, porque se fazendo tudo o que eu faço eu não fico contente, é porque estou fazendo coisas que eu não deveria fazer. Se eu estou descontente com as pessoas que tenho ao lado, então é porque devo não estar com elas. Enfim, se aonde eu me organizei para existir está me deixando muito desconfortável, significa que eu não me organizei segundo aquilo que eu preciso para viver nesse tempo.

– Você já participou de várias edições do Congresso de Felicidade, e em todas conquistou a a interação da plateia. O Congresso, de maneira geral, transmite uma energia muito forte e uma conexão entre palestrantes e plateia. Qual é sua expectativa para mais uma edição presencial do evento em Curitiba?
– Desde que comecei a participar do Congresso, na segunda edição, há uma expectativa das pessoas sobre a minha participação. Às vezes eu falo pro Gustavo (Arns, o organizador do Congresso): ‘Eu acho que deu né, não sei se eu tenho ainda mais o que oferecer’… mas o Gustavo acha importante e no último ano presenciamos realmente um momento muito forte. Sinceramente, essa expectativa das pessoas me desconforta, porque aí eu me sinto na obrigação de fazer aquilo que as pessoas esperam. Mas aí eu digo: ‘não, eu só preciso ser quem eu sou, fazer o que devo fazer’. E também me dei conta de que para cada época eu estou diferente, pois de um ano para o outro a gente muda bastante. Então não será o eu do ano passado que estará no evento deste ano, nem aquele que começou no Congresso há 4, 5 anos. Eu evoluí, mudei, e à medida em que se evolui a gente muda também a linguagem, aprofunda os assuntos, alarga os conceitos… A minha preocupação é simplesmente aquela de ter um tema dentro do qual transitar e me entregar para fazer acontecer. Como o Congresso é um local e um momento de muita energia, eu simplesmente entro nessa energia, movimento essa energia e a trago para ser vivida por meio de falas, contação de histórias e de canções que procuram verdades. Eu sei que quando as pessoas entram numa experiência de amor profundo como é essa que proponho, elas são permeadas em todas as suas células pela força do amor, que conforta e cura qualquer força de dor. Para o próximo Congresso, por enquanto eu só tenho o título: “A dança do universo”. Espero que tenhamos outro momento fabuloso. Acho que cresço mais do que aqueles que estão me ouvindo.


S E R V I Ç O
VI Congresso Internacional de Felicidade
18 e 19 de novembro de 2023
Curitiba – Parque Barigui
Informações e inscrições: www.congressodefelicidade.com.br